Um dos produtos que oferece maiores prejuízos é a água sanitária; recomendação é dar prioridade a água e sabão
A indústria de limpeza cresceu nos primeiros anos da pandemia de Covid-19.
Os protocolos de higienização de escolas, estabelecimentos comerciais e outros espaços públicos foram intensificados. A limpeza de cada superfície com spray e pano após cada utilização tornou-se obrigatória. O medo do coronavírus levou as pessoas a usar mais lenços e sprays desinfetantes em suas casas, e entre 2019 e 2021 os valores gastos por consumidores com produtos de limpeza aumentaram em 12% nos Estados Unidos.
Sabemos agora que é pouco provável que a higienização adicional tenha ajudado a limitar o alastramento da Covid, mas ela aumentou a exposição das pessoas às substâncias químicas contidas nos produtos de limpeza, alguns dos quais trazem risco à saúde.
Especialistas receiam que quando esses produtos são inalados ou entram em contato com a pele repetidas vezes ao longo do tempo, isso possa ser prejudicial. Durante a pandemia também aumentaram as chamadas para centros de controle de intoxicação americanos para perguntar sobre substâncias químicas em produtos de limpeza, principalmente em casos de ingestão acidental ou intencional.
Em alguns casos –como por exemplo o início de uma pandemia nova e desconhecida–, o risco imediato de infecção é preeminente e pesa mais que possíveis consequências futuras da exposição a substâncias químicas. Mas, como hoje sabemos que a desinfecção não deve nos proteger da Covid, vale a pena avaliar se os riscos da utilização de certos produtos de limpeza pesam mais que as recompensas.
É importante destacar que os especialistas que consultamos para redigir esta reportagem disseram que água e sabão simples são o bastante para a limpeza normal.
Veja o que você precisa saber sobre os riscos dos produtos químicos antimicrobiais mais comuns e como reduzir sua exposição a eles ao mesmo tempo em que conserva sua casa higienizada.
QUAIS SÃO AS PREOCUPAÇÕES LIGADAS A ESSES PRODUTOS?
É difícil definir os riscos dos produtos de limpeza porque é difícil quantificar a exposição, e muitas das condições atribuídas a eles, incluindo asma, câncer e infertilidade, levam anos para se apresentar.
Algumas das pesquisas foram feitas em áreas profissionais para determinar se certos problemas de saúde estão mais presentes em pessoas que podem ter exposição alta a produtos de limpeza, como zeladores e enfermeiros. Outros estudos feitos com camundongos buscaram testar mais diretamente a possibilidade de determinados produtos químicos trazerem consequências prejudiciais à saúde. Mas as descobertas feitas com animais nem sempre se aplicam aos humanos.
Segundo as pesquisas disponíveis hoje, os produtos de desinfecção mais preocupantes são os que são usados com mais frequência: compostos de amônio quaternário e água sanitária.
Em ambientes profissionais, os CAQs estão ligados a irritações da pele, asma e outros problemas pulmonares. Vários estudos concluíram que enfermeiras que utilizam os produtos com frequência para a assepsia de superfícies e equipamentos médicos têm índices mais altos de asma e doença obstrutiva pulmonar crônica, mas outro trabalho não encontrou uma ligação significativa. Um estudo de 2021 concluiu que a presença de CAQs no sangue humano está ligada a perturbações das funções imunológicas e metabólicas. A exposição aos compostos de amônio quaternário reduz a fertilidade de camundongos.
Uma série de artigos recentes encontrou altos níveis de CAQs na poeira residencial, em amostras de sangue e até mesmo no leite materno. Pesquisadores mediram os níveis de vários compostos comuns do tipo em produtos de limpeza e comparou os volumes presentes em 2019 e 2020. Foram detectados CAQs na imensa maioria das amostras e, nos estudos com poeira e sangue, os níveis subiram 70% em média após o início da pandemia. Quanto mais frequentemente as pessoas usavam produtos de desinfecção em suas casas, mais elevados eram seus níveis.
"Ficamos realmente surpresos quando começamos a ver os CAQs em todas as amostras e em alto nível", diz Amina Salamova, professora adjunta de saúde ambiental na Universidade Emory, que encabeçou a pesquisa. "A exposição a CAQs é ampla. Isso já ocorria antes da Covid, mas aumentou desde a pandemia."
Não se sabe se o uso doméstico provoca os mesmos problemas vistos em ambientes profissionais. "São necessários estudos mais amplos para avaliar as consequências potenciais na população geral, em ambientes não ocupacionais", aponta Salamova.
Existe também a preocupação de que as CAQs possam contribuir para a resistência de bactérias a antibióticos. Em parte por esse motivo, o FDA (agência reguladora de drogas e alimentos dos EUA) proibiu o uso de um CAQ, o cloreto de benzetônio, em géis desinfetantes para as mãos. O agente desinfetante triclosan também foi proibido para essa finalidade.
À luz dessas evidências crescentes, vários grupos de saúde e ambientais vêm identificando compostos de amônio quaternários como sendo substâncias químicas de risco. Um conselho de assessoria científica do Massachusetts recentemente recomendou que os CAQs sejam incluídos numa lista de substâncias tóxicas ou de risco reguladas, e a Califórnia os incluiu em seu programa de biomonitoramente. A Agência de Proteção Ambiental do país (EPA, em inglês), que regula os CAQs como pesticidas, os classifica em sua segunda mais alta categoria de toxicidade para exposição oral ou inalatória.
A água sanitária, ou alvejante, é um desinfetante mais empregado por muitas pessoas, mas especialistas têm questionado até que ponto ele pode ser usado com segurança.
"É difícil deixar de falar nela", pontua Samara Geller, diretora sênior de ciência higiênica do Environmental Working Group. "A água sanitária está presente em praticamente todos os produtos de limpeza." Segundo ela, as substâncias químicas presentes nela "são muito persistentes no ambiente e são altamente corrosivas".
Devido à sua natureza corrosiva, a água sanitária pode prejudicar a pele e os olhos se ocorrer contato. Diversos estudos também já mostraram que ela está ligada à asma, tanto entre faxineiros profissionais quanto entre pessoas que a utilizam com frequência em suas casas.
Diana Ceballos, professora assistente no departamento de ciências de saúde ambientais e ocupacionais da Universidade de Washington, afirma que uma das recomendações feitas pela Associação Americana de Pulmões para "evitar, prevenir ou melhorar a asma" é evitar o uso de água sanitária.
Um risco exclusivo do alvejante é o potencial de produzir gases tóxicos –ou seja, o gás cloro, que já foi empregado como arma química. A reação ocorre quanto o alvejante é misturado com amônia –encontrada em muitos produtos para limpeza de vidros, produtos para limpeza de fornos e alguns produtos para limpeza geral— ou com ácidos, entre eles o vinagre.
Em 2020, centros de controle de intoxicações notificaram mais de 5.000 casos de exposição a gás cloro ligada à limpeza. Dois dos casos foram fatais. Em um deles, uma mulher morreu depois de misturar um produto de limpeza à base de água sanitária com um tablete de limpeza de privada à base de ácido.
Jamais se deve misturar água sanitária com outro produto de limpeza, a não ser que você tenha certeza absoluta de que este não contém amônia ou ácido.
O QUE DEVE USAR PARA LIMPAR MINHA CASA?
A maioria dos especialistas consultados para este artigo disseram que raramente ou nunca usam desinfetante na faxina de suas casas, optando em vez disso por água e sabão. Eles também aconselharam a opção por ingredientes menos perigosos, como produtos de desinfecção que usam peróxido de hidrogênio ou ácido cítrico.
Há momentos raros em que o uso de produtos químicos mais fortes pode se justificar –por exemplo, se você estiver combatendo um surto de norovírus em sua casa. Se você for usar um desinfetante, abra a janela ou ligue o extrator de ar para reduzir sua exposição. Usar máscara e luvas também ajuda.
"Especialmente desde a Covid, muitas pessoas estão usando muitos produtos, e às vezes não o fazem de modo seguro", diz Salamova. "Então eu recomendaria que, não importa o produto utilizado, que se sigam as diretrizes e usem os produtos de modo seguro."
Tradução de Clara Allain
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